Decorreram mais duas sessões dos Clubes de Leitura na Escola para as turmas do 6.º B e 6.º G nos dias 10 e 12 de abril de 2023, respetivamente.
Com o intuito de levar os alunos a experienciar um espetro vasto de emoções, e muito para lá da habitual história com happy ending, a obra escolhida foi O Aniversário da Infanta, uma das obras-primas de Oscar Wilde, reconhecida pelo seu simbolismo poético e pela análise profunda da natureza humana.
O conto de Wilde é fortemente influenciado por movimentos artísticos como o Simbolismo e o Esteticismo, com muitas descrições detalhadas e uso de linguagem poética.
Este conto curto explora temas complexos como a beleza, a morte e a dor, numa narrativa repleta de imagens vívidas e linguagem deslumbrante.
A história passa-se em Espanha em meados do século XVI e gira em torno da Princesa Real e Infanta de Espanha, que vê o seu aniversário celebrado com uma grandiosa festa na corte.
Neste dia a infanta conhece um anão grotesco que vem participar na festa com uma performance circense e acaba por se apaixonar por ela quando esta lhe atira uma rosa, para poucas horas depois descobrir um destino trágico.
A obra explora o tema da maldade de forma profunda e poderosa, retratando a crueldade e a indiferença da alta sociedade para com os mais vulneráveis. A Infanta de Espanha, tão bela quanto má, demonstra um completo desprezo pela deformidade física do anão, tratando-o com desdém e indiferença. Mesmo diante do sofrimento do pequeno anão, a Infanta é incapaz de compreender a sua dor e a sua busca de aceitação e afeto. A crueldade da bela Infanta nada mais é do que o reflexo da intolerância e a falta de empatia de uma elite aristocrática guiada por uma rígida estrutura social.
A busca por aceitação e afeto do anão é pois inexoravelmente frustrada, culminando na sua morte trágica e permanecendo como mais um reflexo sombrio da crueldade intrínseca de uma corte conhecida pelo seu gosto do bizarro.
Os golpes aplicados por Wilde a esta sociedade são cortantes e deixam a nu uma nobreza vazia e superficial, incapaz de genuína compaixão.
O Inquisidor-Mor lacrimeja ao ver um espetáculo de títeres, perguntando-se como podem tão inocentes criaturinhas sofrer tamanhas provações, enquanto manobra o longo e impiedoso braço da Inquisição Espanhola e dos seus sanguinários autos-de-fé.
Mesmo a Infanta, quando se emociona com o espetáculo, está apenas a replicar os comportamentos hipócritas dos adultos que a rodeiam, os mesmos que se asseguram em extirpar da sua alma qualquer resquício de humanidade.
A falta de empatia da corte é um reflexo da própria sociedade espanhola, que valoriza as aparências em detrimento da humanidade, que se concentra apenas nos seus próprios interesses e prazeres, e pior do que tudo, que transmite às novas gerações a maldade e a indiferença como valor educativo.
A sociedade aqui retratada, podre e espiritualmente doente, jamais poderia ter lugar para o anão que, com a sua aparência física disforme, se torna inferior e indigno de a ela pertencer. É esta condição que o leva à exclusão social e o condena a viver à margem da corte e da própria vida.
Apesar da sua fealdade, esta pequena criança permanece contudo como a representação da pureza e da inocência, em contraste com a crueldade vigente. Mas sendo esta pureza tão vulnerável, não consegue triunfar sobre a maldade que impregna a corte.
Também a mãe da Infanta, frágil flor trazida de França, se estiola rapidamente sob o sol inclemente de Espanha e a visão aterradora das chamas da Santa Inquisição.
Tanto a falecida mãe da Infanta quanto o pequenino anão, estigmas da diferença, não encontram lugar numa sociedade onde o bem, quando ameaça despontar, é imediatamente cerceado. É o triunfo do mal sobre a fragilidade do bem!
No entanto, ao retratar de maneira complexa o anãozinho, com profundidade psicológica e emocional, Wilde torna-o no que de mais belo esta obra contém. Para quem lê e se emociona com o seu triste e solitário fim, a apologia é a do bem e da bondade.
A maestria literária de Wilde, aliada à abordagem profunda do tema da maldade, garantiu à obra o seu lugar de destaque na literatura. A obra permanece pois relevante como uma crítica contundente aos valores sociais, ao condenar a indiferença, a hipocrisia e a falta de empatia da aristocracia.
Ao denunciar a indiferença da nobreza e da realeza diante do sofrimento e da miséria das classes populares e ao expor o contraste entre a opulência e o luxo da vida da nobreza com a miséria e a privação das classes populares, ressaltando uma gritante desigualdade social, Wilde advoga a necessidade de uma sociedade mais compassiva e inclusiva, e nesse sentido a obra reveste-se de grande atualidade e pertinência.
Tal como em muitas das suas obras, Wilde utiliza a literatura como ferramenta de crítica social e destaca a importância de reconhecer a humanidade e o valor de todos os indivíduos, independentemente de sua classe social.
Para além das temáticas da obra, a prosa de Wilde é considerada uma das mais belas da literatura inglesa, com uma riqueza de detalhes e uma linguagem rebuscada que obrigou os alunos a irem muitas vezes ao dicionário.
É exímia a sua habilidade de criar imagens poéticas e explorar a psicologia dos personagens, elevando a narrativa a um nível artístico quase supremo.
Desde sua publicação, O Aniversário da Infanta tem recebido elogios da crítica literária pela sua complexidade temática e estética. Muitos estudiosos consideram o conto uma das melhores realizações de Wilde, destacando a sua maestria na construção de uma narrativa trágica e emocionante.
O retrato que faz da condição humana, da beleza e da crueldade, é tão relevante hoje quanto quando foi escrito, e por isso o conto permanece como mais uma das obras-primas que solidificaram o lugar de Oscar Wilde como um dos maiores escritores do fim do século XIX.
A verdade é que a obra de Wilde continua a inspirar e a influenciar gerações de leitores e artistas, e sem dúvida deixou uma forte impressão em todos os elementos do Clube de Leitura que a leram e refletiram sobre ela.
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